Mais do que simples meio de recomposição do erário, a extensão da condenação ao patrimônio pessoal é meio de defesa desses mores que se formam por meio da institucionalização de práticas de bom governo da coisa pública, as quais se sedimentam lentamente como usos ou mores da administração, se degradam a cada vez que sofrem violação e não se recuperam sem a devida responsabilização de quem os feriu.
Com esse entendimento, a 8ª Câmara de Direito Público do Tribunal de Justiça de São Paulo confirmou a penhora de aproximadamente R$ 128 milhões em bens deixados de herança pela mãe do ex-deputado Paulo Maluf. Os recursos serão destinados aos cofres da Prefeitura de São Paulo.
Maluf foi condenado em ação popular em razão do uso indevido de um símbolo de campanha eleitoral na publicidade de atos, programas e campanhas e nos uniformes de funcionários dos órgãos públicos enquanto foi prefeito da capital, entre 1993 e 1996. Ao TJ-SP, a defesa do ex-governador sustentou que os bens deixados pela mãe foram gravados no testamento com cláusula de impenhorabilidade. Mas o recurso foi negado, por votação unânime.
Segundo o relator, desembargador Bandeira Lins, a possibilidade de o ente público se valer de execução fiscal para a cobrança de seus créditos (tributários ou não-tributários) tem previsão na Lei 6.830/80, "cujo artigo 30 não deixa margem para dúvidas acerca da inoponibilidade, à dívida para com a Fazenda, de cláusula de impenhorabilidade instituída em testamento".
Considerando que Lei de Execuções Fiscais não faz distinção quanto à natureza da dívida para efeito de sua aplicação e que se trata, nos autos, de dívida certa, líquida e exigível, tal qual exige o 39, § 1º, da Lei 4.320/64, Lins disse que o crédito dos autos goza das mesmas prerrogativas de que a Fazenda dispõe para a cobrança de dívida tributária, tratando-se em qualquer dessas hipóteses de dinheiro devido aos cofres públicos.
"A impenhorabilidade absoluta de certos bens e rendas tem como objetivo a garantia do patrimônio mínimo, de modo a assegurar que a execução de dívida encontre limite na dignidade pessoal do devedor. Não se comprova nos autos que este seja o caso", completou. Por fim, ele destacou que a medida atende ao interesse público de efetivação das sanções de cunho patrimonial àqueles que praticam atos em "detrimento dos mores republicanos, externando sob essa forma a reprovabilidade da conduta e desestimulando a respectiva reiteração".
Desse modo, não havendo prova cabal de que a integralidade do patrimônio de Maluf, a sua subsistência ou a de sua família venham a ser sacrificados pela constrição, o desembargador concluiu que a decisão de primeiro grau que negou o levantamento não comporta reforma.
2013137-20.2020.8.26.0000
Fonte: CONJUR
0 Comentários